A recente Lei n.º 16/2022 de 16 de agosto aprova a (nova) Lei das Comunicações Eletrónicas, transpondo para a ordem jurídica nacional as Diretivas 98/84/CE, 2002/77/CE e (EU) 2018/1972.
A maior (e, porventura, mais interessante) novidade legislativa, entre outras, reside na matéria de cancelamento do contrato de telecomunicações – nomeadamente, o, amplamente conhecido, período de fidelização. No presente, abordamos as novidades mais relevantes para o consumidor, no que concerne ao período de fidelização, e que deve ter presente a fim de se manter informado enquanto parte de um contrato de telecomunicações.
Note que, pese embora algumas normas da Lei em análise, designadamente as relacionadas com segurança das redes e serviços e com a fiscalização tenham entrado em vigor a 17 de agosto, a generalidade das normas que compõe a presente Lei entraram em vigor no passado dia 14 de novembro de 2022. Exceção feita para as regras relativas ao cálculo dos encargos em caso de denúncia, que serão aplicáveis a partir do próximo dia 13 de janeiro de 2023.
A imposição de um período de fidelização, enquanto condição associada à celebração de um contrato de telecomunicações é, naturalmente, um empecilho quando se pretende cancelar um contrato, seja por que motivo for. Ora, parece-nos que, bem vistas as coisas, a nova Lei das Comunicações Eletrónicas é um passo em frente, que facilita o processo, em determinadas situações.
No que diz respeito ao período de fidelização que as entidades de telecomunicações poderão aplicar nos contratos, a verdade é que se mantém o mesmo que já era regulado pela antiga lei: as empresas podem apresentar períodos de fidelização de 6, 12 e 24 meses. Todavia as empresas estão obrigadas a disponibilizar ofertas sem fidelização. A relevância está no facto de que, querendo estabelecer um período de fidelização, as empresas apenas o podem fazer desde que exista a atribuição aos consumidores de contrapartidas, devidamente identificadas e quantificadas no contrato, associadas à subsidiação de equipamentos terminais, à instalação do serviço, quando aplicável, à ativação do serviço ou a outras condições promocionais – conforme já se previa anteriormente.
Posto isto, durante o período de fidelização o utilizador final está adstrito a não denunciar o contrato ou a não alterar as condições acordadas. A inovação legislativa reside aqui: é que a nova Lei prevê 4 situações em que o consumidor/utilizador pode rescindir antecipadamente o contrato, durante o período de fidelização sem que a empresa possa exigir ao titular do contrato o pagamento de quaisquer encargos relacionados com o incumprimento do período de fidelização.
Assim, tome nota que o pode fazer nas seguintes situações:
- No caso de alteração de residência permanente quando não for possível ao operador assegurar a prestação do serviço contratado ou de serviço equivalente, nomeadamente em termos de caraterísticas e de preço, na nova morada;
- Na situação de mudança imprevisível da habitação permanente do consumidor titular do contrato para país terceiro;
- Situação de desemprego involuntário do consumidor titular do contrato, desde que exista a diminuição de rendimentos igual ou superior a 20 %;
- Incapacidade para o trabalho, permanente ou temporária de duração superior a 60 dias, do consumidor, nomeadamente em caso de doença, que implique diminuição de rendimentos igual ou superior a 20 %.
Se se encontrar numa destas situações, o utilizador que pretenda resolver o contrato, deve manifestar a sua intenção de cancelar o contrato de telecomunicações por escrito, com uma antecedência mínima de 30 dias em relação à data em que pretende rescindir. No caso de se dever a situação de desemprego, doença ou mudança de residência, terá de apresentar documentação que comprove tal posição.
Por outro lado, no caso de não se encontrar em nenhuma daquelas situações, a verdade é que, tendo celebrado um contrato de telecomunicações associado a um período de fidelização, estará adstrito a cumpri-lo. Porém, tal não implica, logicamente, que esteja preso a um contrato do qual não pode sair: sempre poderá fazê-lo, aplicando-se uma consequência manifestada no pagamento de uma quantia. E, aqui surge um outro campo onde a nova lei introduz novidades.
Assim, o consumidor/utilizador pode denunciar o contrato durante o período de fidelização, podendo, por sua vez, a empresa de telecomunicações cobrar-lhe o pagamento de encargos. No entanto, a nova Lei prevê que, em caso de cessação antecipada por iniciativa do consumidor, tem lugar o pagamento de encargos que não podem exceder o menor (!) dos seguintes valores:
- A vantagem conferida ao consumidor, como tal identificada e quantificada no contrato celebrado, de forma proporcional ao remanescente do período de fidelização;
ou
- Uma percentagem das mensalidades vincendas, nos seguintes termos:
- Tratando-se de um período de fidelização inicial: 50 % do valor das mensalidades vincendas se a cessação ocorrer durante o primeiro ano de vigência do contrato; ou, 30 % do valor das mensalidades vincendas se a cessação ocorrer durante o segundo ano de vigência do contrato;
- Tratando-se de um período de fidelização subsequente: não existindo alteração do lacete local instalado, 30 % do valor das mensalidades vincendas; ou, existindo alteração do lacete local instalado, aplica-se o previsto para o período de fidelização inicial
(Nota: considera-se lacete local, o percurso físico utilizado por sinais de comunicações eletrónicas que liga o ponto de terminação de rede nas instalações do utilizador final a um repartidor ou ao recurso equivalente na rede pública de comunicações eletrónicas fixas.)
Posto isto, conclui-se que a nova Lei vem trazer novidades que tornam mais atrativo para os utilizadores o período de fidelização, sempre tendo em vista que, a previsão de um período de fidelização num contrato de telecomunicações já é, em si mesmo, uma vantagem económica para os consumidores pois que a lei prevê que o mesmo apenas pode existir desde que associado a um benefício.
Dra. Marisa Simões
Dra. Marta S. Neto