Nos termos do princípio geral da garantia das obrigações, pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor que sejam suscetíveis de penhora (arts. 601.º do CC e 735.º do CPC). Deste modo, sendo movida uma ação executiva apenas contra um dos cônjuges, por uma dívida própria dele ou da responsabilidade de ambos, pode suceder que a penhora venha a recair sobre os bens comuns do casal, por inexistência ou insuficiência de bens próprios do cônjuge executado que permitam a satisfação integral da dívida exequenda e das custas da execução. Com efeito, nos termos do art. 1696.º, n.º 1, do CC, pelas dívidas da responsabilidade de um dos cônjuges respondem os bens próprios do cônjuge devedor e, subsidiariamente, a sua meação nos bens comuns do casal.
- Penhora de salário
O salário constitui um bem comum do casal quer no regime supletivo da comunhão de adquiridos, quer no regime da comunhão geral de bens [arts. 1724.º, al. a), 1732.º e 1734.º do CC]. Consequentemente, à luz do art. 1696.º do CC, sendo movida uma ação executiva contra apenas um dos cônjuges, por dívida própria dele, pode ser penhorado o salário do cônjuge não executado quando não sejam conhecidos bens próprios do devedor.
É certo que a lei de processo civil vigente consagra um instrumento de proteção do cônjuge do executado em caso de penhora de bens comuns do casal, consubstanciado na obrigação de este ser citado para, no prazo de vinte dias, requerer a separação de bens ou juntar certidão comprovativa da pendência dessa ação (art. 740.º, n.º 1, do CPC).
Acontece que, se o cônjuge do executado, uma vez citado, nada disser, a execução prosseguirá sobre o seu salário, ainda que este não seja responsável pela dívida exequenda (art. 740.º, n.º 1, in fine, do CPC).
Por outro lado, mesmo que o cônjuge do executado requeira a separação de bens ou proceda à junção da certidão comprovativa da pendência dessa ação, a penhora do seu salário subsistirá até que se verifique a partilha de bens entre os cônjuges (art. 740.º, n.º 2, do CPC).
- Penhora de bem imóvel que constitua a casa de morada de família
No nosso ordenamento jurídico, a habitação beneficia de tutela constitucional no art. 65.º da CRP, segundo o qual “Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar”. De todo o modo, “o direito à habitação do cidadão e da família não se confunde com o direito a ter casa própria”. Por esse motivo, entende o Tribunal Constitucional que a penhora de imóvel que constitua a casa de morada de família do executado e/ou do seu agregado familiar não ofende o direito constitucional à habitação.
Ora, sendo penhorado um bem imóvel que constitua a casa de morada de família, a lei consagra diversos mecanismos de proteção desse bem. Com efeito, o Código de Processo Civil prevê a possibilidade de suspensão da venda executiva da casa de morada de família quando tenha sido interposto recurso da sentença que serve de título à execução (art. 704.º, n.º 4) ou quando tenham sido deduzidos embargos à execução (art. 733.º, n.º 5), a nomeação do próprio executado como fiel depositário quando o bem imóvel penhorado constitua a casa de morada de família (art. 756.º, n.º 1, al. b) ou ainda a citação obrigatória do cônjuge do executado quando a penhora tenha recaído sobre a casa de morada de família (arts. 786.º, n.º 1, al. a), e 787.º, n.º 1).
Analogamente, o Código Civil estabelece no seu art. 1682.º-A a necessidade de consentimento de ambos os cônjuges, independentemente do regime de bens, para a alienação, oneração, arrendamento ou constituição de outros direitos pessoais de gozo sobre a casa de morada de família.
Todavia, se for penhorado um bem comum do casal que constitua a casa de morada de família, por insuficiência ou inexistência de bens próprios do cônjuge devedor, a lei apenas atribui ao cônjuge do executado o direito de ser citado para requerer a separação de bens ou juntar a certidão comprovativa da pendência dessa ação.
Paralelamente, se for penhorado um bem próprio do executado que constitua a casa de morada de família, a lei apenas concede ao cônjuge do executado o direito de intervir na execução [art. 786.º, n.º 1, al. a), do CPC], podendo, no prazo de vinte dias, deduzir oposição à penhora ou exercer, nas fases posteriores à citação, todos os direitos que a lei processual confere ao executado, podendo cumular eventuais fundamentos de oposição à execução (art. 787.º, n.º 1).
Constata-se, assim, que estes regimes jurídicos não impedem a penhora da casa de morada de família, nem evitam a subsequente partilha desse bem ou a sua venda executiva.
Dra. Delfina Rita Mendes
Dra. Helena Alves de Sousa