Ao trabalhador por conta de outrem incumbe o dever de comparecer ao trabalho com assiduidade e pontualidade [art. 128.º, n.º 1, al. a) do Código do trabalho – doravante, CT]. Porém, não raras vezes, as necessidades, responsabilidades e preocupações pessoais, afetivas e sociais do trabalhador prevalecem sobre aquele dever, tendo o legislador previsto e regulado a hipótese de tal dever não ser satisfeito, por o trabalhador faltar ao trabalho.

A falta ao trabalho é legalmente definida como “a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho (art. 248.º. n.º 1 do CT).

As faltas podem ser justificadas ou injustificadas, consoante o motivo que determinou a ausência. O leque das faltas justificadas encontra-se no art. 249.º, n.º 2 do CT, sendo injustificadas as demais.

Consideram-se justificadas as faltas dadas por morte de familiar, nos termos do art. 251.º, al. b) do CT. O leque de familiares cujo falecimento permite ao trabalhador faltar justificadamente são os descendentes ou afins no 1.º grau na linha reta (filhos e enteados) – casos em que o trabalhador pode faltar até 20 dias consecutivos; cônjuge não separado de pessoas e bens  e parente ou afim ascendente no 1.º grau na linha reta (pais, sogros, padrasto/madrasta, bem como, de acordo com o n.º 2 do referido normativo, pessoa que viva em união de facto ou em economia com o trabalhador) – casos em que o trabalhador pode faltar até 5 dias consecutivos; parentes ou afins noutros graus de linha reta (avós, bisavós, etc) e no 2.º grau da linha colateral (irmão ou irmã, cunhado ou cunhada) – casos em que é permitido faltar até 2 dias consecutivos.

Uma questão suscitada por esta normal legal é a de saber se, com a locução “dias consecutivos”, o legislador quis referir-se a dias de calendário, ou, diferentemente, somente aos dias de trabalho do trabalhador em causa, que, porém, teriam de ser gozados sem intervalos. Embora se admita que a redação da norma possa sugerir aquela primeira resposta, entende a doutrina maioritária que existe um argumento lógico apontando neste último sentido: só poderá falar-se em falta se se verificar uma ausência do trabalho em dias em que o trabalhador tinha a obrigação de trabalhar, o que significa que os dias não úteis do trabalhador em causa não são contemplados naquele cômputo. A exigência legal de que os dias sejam gozados consecutivamente visa significar que o gozo não deve ser interpolado, mas antes em bloco.

O Tribunal da Relação do Porto, no seu acórdão datado de 13-07-2022 (disponível em www.dgsi.pt) foi confrontado com a questão de saber em que sentido deve interpretar uma cláusula de um Contrato Coletivo de Trabalho sob a epígrafe “Faltas por motivo de falecimento de parentes ou afins”, nos termos da qual o trabalhador pode faltar justificadamente até 5 dias consecutivos por falecimento de cônjuge ou de parente ou afim no 1.º grau na linha reta e até 2 dois consecutivos por falecimento de outro parente ou afim na linha reta ou em 2.º grau da linha colateral.

Precisando, encontrava-se em discussão, a interpretação a fazer da expressão “dias consecutivos” constante daquela: se, apenas, como dias úteis, ou seja, fazendo a sua contagem em concordância com o conceito de “falta” e, consequentemente, só se considerando, naqueles, os dias em que existe obrigação de trabalhar, ou, então, como sendo dias seguidos (independentemente de serem dias úteis ou dias de trabalho ou dias de descanso).

O Tribunal de recurso decidiu que os dias consecutivos têm de conter dias de trabalho para que se possa falar em falta e assim na contagem das faltas por motivo de falecimento, não podem ser contabilizados os dias de descanso e feriados intercorrentes por não existir ausência do trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário.

Ou seja, não se pode deixar de atender, na contagem dos dias consecutivos, ao conceito de falta inserido na norma legal, sendo que esta, por força do artigo 248º do Código do Trabalho, supõe «a ausência de trabalhador do local em que devia desempenhar a atividade durante o período normal de trabalho diário».

A leitura que fez foi na esteira do entendimento perfilhado por João Leal Amado, João Reis e Menezes Leitão, para os quais se afigura óbvio que nos “dias consecutivos” não poderão ser computados os dias de descanso e/ou os feriados intercorrentes, pela simples razão de que nestes não se verifica qualquer falta ao trabalho.

 

Dra. Delfina Rita Mendes

Dra. Helena Alves de Sousa