Pese embora as redes sociais configurem uma realidade muito presente no panorama atual, a verdade é que o Código do Trabalho não prevê qualquer norma que se refira, especificamente, às redes sociais. Daqui surge a questão: será que um trabalhador pode ser despedido com base em publicações que tenha feito nas redes sociais, sejam elas escritas ou gravadas? A resposta pode ser simples, mas o meio através do qual se alcança a mesma não se mostra assim tão evidente (meramente devido ao facto de não existir previsão legal direta sobre o presente assunto).

Imaginemos o seguinte caso, que nos deve acompanhar durante a leitura da presente, como exemplo do que se irá expor infra: Um trabalhador, que trabalha numa empresa, onde está sujeito à direção e controlo do seu empregador, manifestamente desagradado com uma atitude que com ele foi tomada, decide recorrer ao seu perfil aberto de Facebook para publicar um comentário desagradável sobre o seu empregador, identificando a empresa e expondo, deste modo, a sua opinião e a forma como se sentiu naquele dia.

Antes de mais, estabelecemos que: sim! As publicações que um trabalhador faça sobre a empresa onde trabalha, nas suas contas de redes sociais (sejam elas públicas ou privadas) podem dar origem a um processo disciplinar, que, em casos limite, podem terminar em despedimento do trabalhador. Isto porque, em abstrato (isto é, não nos referindo, em concreto, às publicações nas redes sociais), os comportamentos dos trabalhadores podem provocar a abertura de um processo disciplinar, que correrá internamente, e tem o objetivo principal de apurar se aquela conduta adotada pelo trabalhador representa – ou não – um incumprimento a um dever laboral do trabalhador.

Note, no entanto que, à semelhança do supra mencionado, mesmo recorrendo aos deveres do trabalhador, a verdade é que não existe um dever que estabeleça concretamente o que o trabalhador pode ou não publicar nas redes sociais pessoais.

Esta questão contende diretamente com o direito à privacidade do trabalhador. Neste sentido, o nosso Código do Trabalho prevê que: “O empregador e o trabalhador devem respeitar os direitos de personalidade da contraparte, cabendo-lhes, designadamente, guardar reserva quanto à intimidade da vida privada”. Deste modo, aplicam-se às publicações nas redes sociais as regras relativas à proteção da privacidade do trabalhador que resultam da lei geral e, em especial, do Código do Trabalho.

Todavia, por outro lado, não podemos negar que existem situações em que a vida privada do trabalhador pode ter repercussões no âmbito laboral. Sendo que, é neste sentido que se poderá admitir que o empregador possa regular aspetos dessa vida privada, e, até, sancionar comportamentos do trabalhador que, pese embora tenham sucedido fora do ambiente de trabalho, tenham repercussões na empresa.

Assim, a proteção de que beneficia o trabalhador quanto à reserva da sua vida privada encontra balizas quando entramos no âmbito da proteção dos direitos fundamentais dos colegas ou, como sucede no nosso exemplo, do empregador, ou, ainda, no âmbito do princípio da boa-fé no cumprimento do contrato de trabalho.

Posto isto, pese embora a ausência de legislação especial, a realidade a que temos assistido mostra-nos que, o uso massificado das redes sociais, causa, inevitavelmente, um reflexo direto e proeminente das publicações dos trabalhadores na vida das empresas.

Neste seguimento, e detetando um comportamento como o descrito no nosso exemplo, o que sucederá é a empresa abrir, internamente, um processo disciplinar em ordem a apurar se aquela conduta é ou não um incumprimento a um dever do trabalhador. Ora, cumpridas todas as etapas, previstas legalmente, do processo disciplinar, se se concluir pela existência de um incumprimento de deveres pelo trabalhador, então ser-lhe-á aplicada uma sanção; caso contrário, o processo é arquivado.

Aqui chegados, quais podem ser as sanções? De acordo com o Código de Trabalho, as sanções podem ser: a repreensão; repreensão registada; sanção pecuniária (isto é, pagamento de uma compensação à entidade empregadora); perda de dias de férias; suspensão do trabalhador com a perda da retribuição e de antiguidade; e, no limite, o despedimento sem direito a indemnização ou compensação.

Em tom de nota final, os nossos tribunais já julgaram casos como estes, sendo que, existem já decisões em que o Tribunal considera o despedimento lícito e com justa causa quando baseado em determinadas publicações nas redes sociais (mesmo tratando-se de comentários feitos num grupo fechado e privado da rede social).

 

Dra. Delfina Rita Mendes

Dra. Marta S. Neto