“Há normas que ofendem Direito, Liberdades e Garantias (ou, simplesmente direitos fundamentais) a vigor no ordenamento jurídico português”. Tal afirmação à primeira vista parece contraproducente, podemos perguntarmos “Como é que é possível?”; “Ofendem direitos basilares do Estado-de-Direito democrático e são eficazes?”; “O Tribunal Constitucional, enquanto guardião da Constituição, não pode cessar a vigência dessas normas?”.
Sim, o Tribunal Constitucional pode declarar, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade de normas incompatíveis com direito fundamentais. Para que tal aconteça e nos termos do sistema de fiscalização abstrata da constitucionalidade previsto no artigo 281.º da Constituição da República Portuguesa, em especial o n.º 3 do mesmo preceito, o Tribunal aprecia e declara inconstitucionais as normas que hajam sido julgadas inconstitucionais em três casos concretos.
Foi o caso das normas dos artigos 4.º, conjugado com o artigo 6.º e a norma do artigo 9.º, da Lei n.º 32/2008, de 17 de julho – a chamada Lei dos Metadados – entretanto declaradas inconstitucionais.
Desde a entrada em vigor da Lei n.º 32/2008, as disposições eram inconstitucionalidade por serem contrárias/violarem o disposto nos n.ºs 1 e 4 do artigo 34.º (direito ao sigilo da correspondência e da comunicação), do n.º 1 do artigo 26.º (direito à reserva da intimidade da vida privada), em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.º e n.º 1 do artigo 20.º (direito à tutela jurisdicional efetiva), todos da Constituição. Contudo, passados 14 anos foram declaradas inconstitucionais, com força obrigatória geral, prevalecendo, assim, os direitos fundamentais dos cidadãos, principalmente aqueles que estão/estarão envolvidos em processos criminais.
De facto, a Lei n.º 32/2008 é um bom instrumento para a investigação da criminalidade mais grave, mas não vale tudo para a combater/preveni-la, o respeito pelos direitos fundamentais é primordial, especialmente quando a privação da liberdade, um direito essencial de todos os cidadãos, pode estar iminente.
Resta agora aguardar pelas alterações do legislador à Lei n.º 32/2008, face à declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, daquelas disposições.
Dra. Delfina Rita Mendes
Dr. Félix Azevedo Monteiro