As proibições de prova, em processo penal, representam meios processuais de imposição da tutela de Direitos, constituindo verdadeiros limites à descoberta da verdade material. Visando, contudo, prevenir determinadas manifestações de danosidade social e garantindo a integridade de bens jurídicos pessoais. As regras de proibição de prova, decorre, portanto, da salvaguarda de preceitos constitucionais, encontrando-se definidas e concretizadas na legislação processual penal.

Numa primeira fase, estas regras servem a tutela dos Direitos Fundamentais, dirigindo-se às instâncias formais de controlo, designadamente, aos órgãos de polícia criminal, Ministério Público e Juízes de Instrução. Ou seja, balizam a prova que pode, ou não, ser obtida legitimamente na fase de inquérito de um determinado processo criminal. Com a natural consequência de que, as provas obtidas em incumprimento dessas regras, sejam consideradas provas proibidas e como tal não possam ser reproduzidas e atendidas em sede de julgamento.

No que nesta fase diz respeito, são consideradas provas proibidas as vídeo gravações obtidas mediante intromissão na vida privada, sem o consentimento do respetivo titular (conforme n.º 3 do artigo 126.º do Código de Processo Penal). Isto porque, do vasto leque existente de Direitos de personalidade, toda e qualquer pessoa é titular do Direito à imagem e à reserva da sua vida privada, direitos suscetíveis de serem limitados e restringidos em função da prossecução de outros Direitos ou fins, nomeadamente, a perseguição penal, de acordo com o princípio da proporcionalidade e do mínimo indispensável e mediante autorização.

Por outro lado, diferenças existem quanto à utilização de vídeo gravações obtidas por particulares. Neste campo, estabelece o artigo 167.º do Código de Processo Penal que só têm validade como prova, as reproduções que não forem ilícitas nos termos da lei penal. Constatando-se que o legislador impôs para a determinação do valor probatório das vídeo gravações efetuadas por particulares, o critério da licitude penal substantiva. Concretizando, a delimitação quer da legitimidade para efetuar a gravação, quer da legalidade da sua valoração como prova dos factos que ela contenha, encontra-se dependente de se, isoladamente, esse ato de gravação seria suscetível de ser punível nos termos dos artigos 192.º e 199.º do Código Penal.

Nos termos do artigo 192.º do Código Penal, os atos de captar, fotografar, filmar, registar ou divulgar imagem das pessoas ou de objetos ou espaços íntimos, tem censurabilidade penal, se forem praticados sem o consentimento e com intenção de devassar a vida privada do titular do bem jurídico protegido. Sendo necessária a verificação de dois requisitos cumulativos, para que exista o preenchimento do elemento objetivo do tipo legal de crime, designadamente, a falta de consentimento e que quem efetua a gravação o faça com o propósito de devassar a vida privada do visado. Claro está, que quem efetua uma gravação de forma preventiva, no sentido de tentar dissuadir um agente a praticar um outro crime, ou de forma a registar um comportamento suscetível de ser uma prática criminosa, em regra, não atua com a intenção de devassar, mas sim de proteger outro bem jurídico ou assegurar meios de prova que possibilitem que a verdade formal se aproxime da verdade material, inerentemente permitindo que se “faça justiça”.    

Por outro lado, para que tal se possa aferir, será necessário decompor as vídeo gravações em duas condicionantes, ou seja, compreender que estas são compostas por um elemento gráfico e um elemento áudio, que em si podem atentar contra dois bens jurídicos distintos, distrate lesarem o Direito de imagem ou lesarem o Direito da palavra. Razão pelo qual o artigo 199.º do Código Penal se fraciona, exigindo como requisito para o preenchimento do elemento objetivo do tipo legal de crime, no caso da componente áudio, que a sua gravação ocorra sem o consentimento da pessoa gravada. Ao passo que, para a componente gráfica, exige-se que se verifique que a captura da imagem seja realizada contra a vontade de capturado. Pelo que, no primeiro caso constitui um ilícito penal quem sem pedir o consentimento de outra pessoa gravar palavras por ele proferidas, enquanto no segundo caso, só constitui ilícito criminal quem, consciente que a pessoa não quer ser filmada, o filma mesmo assim, não dependendo do consentimento.

Importa salientar que, para aferir a validade de gravações vídeo, a ilicitude criminal destas tem de ser excluída, tanto da forma da captura ou gravação como do fim que lhe é dado, exatamente com os mesmos requisitos, nos termos do artigo 199.º do Código Penal. Uma vez que, no que a este tipo de ilícito respeita, o legislador parece sufragar uma tese dualista, autonomizando a obtenção e a futura utilização das imagens e dos áudios. O que leva a querer que, por vezes a obtenção pode ser licita e a sua utilização ilícita.

Resultando que, no caso de gravações de áudio, estas só podem valer como prova em julgamento se o Arguido desse o seu consentimento para esse fim, o que dificilmente se verificaria, e quanto à imagem só se a utilização desta em julgamento não fosse contrária à vontade do Arguido, limitando o uso deste meio de prova às imagens que provassem factos a favor do arguido, atendendo à vontade presumível deste. Motivo pelo qual, atendendo à proporcionalidade dos bens jurídicos ameaçados e a juízos de razoabilidade, circunstâncias existem em que, apesar da obtenção da gravação possa preencher, abstratamente, o tipo de ilícito criminal do artigo 199.º do Código Penal, reclamem o exercício legitimo do Direito de necessidade defensivo por banda do lesado, nos termos do artigo 34.º do Código Penal, removendo a ilicitude do ato. Nesse caso, e de acordo com a posição do Ilustre Prof. Dr. Manuel da Costa Andrade, se uma gravação foi justificadamente realizada a coberto do Direito de necessidade com vista à prossecução de um determinado fim, ela pode ser legitimamente utilizada ou valorada com vista à concretização desse mesmo fim.

Por outro lado, sempre que a obtenção seja legitima, mas se entenda que a utilização como meio de prova não o seja, nada obsta que as pessoas que viram as vídeo gravações, possam depor como testemunhas sobre o que viram e ouviram nessas gravações. Ficando o seu depoimento, naturalmente, dependente da livre apreciação do juiz da causa.